de tempos atrás, 16:58

B,

com o passar dos dias
choramos menos
porque?

na verdade, parece mais fácil fragmentar a transpor. na verdade, não penso. na verdade, o dia foi tão vazio que parece que nada há que preencha a noite. em verdade, a solidão sempre foi cheia. não mais.

hoje busquei antigas imagens pra me ocupar ao dormir. o que não me parece bom, ponderei antes de fazê-lo. não é bom pensar no que passou, trazer de volta, talvez fique, talvez volte por um tempo.
e agora que se chora menos, se alivia menos.
o alívio parece provir de compreensão, apenas.

hoje acordei menos entediada. hoje acordei menos pesada. ainda assim, continuo perdida. hoje continuo pensando que é normal estar perdida, é só se fazer de confortável, de despreocupada, não pensar muito sobre o tempo. hoje revisei o meu espaço. recriei meus cantos, querendo talvez tomar coragem para me aproximar de uma imagem nova. preenchi minhas paredes com cores novas, e texturas variadas; com as velhas, reformulei sequências. no meio da profusão, reencontrei papel e palavras tortas. eram tão antigas quanto se podem ser para o novo, e eram tão próximas quando eu me julgava distante. lembrei que talvez eu pudesse sim ser clara, que assim eu pudesse me ler depois de um tempo, saber o que se passava, se passa comigo. me acalentar. universalizar e fazer drama é reconfortante.

hoje me descobri menos vaga. a tardinha me veio uma agonia sem fim. fiquei rabiscando no tempo. comprei folhas novas, achei pedaços de outras nas minhas recordações, e então cortei-as, para que coubesse o que eu queria falar. a verdade é que não ruminei meus últimos dias. então me fiz próxima do papel, pressionei minha pele, me fiz borrar. minhas digitais, que pouco reparo, se tornaram muitas, misturaram cores - tinta. me afastei. evitei a contemplação, não chovia.

hoje choveu. estava na sala, então me levantei, fui até a porta e me sentei. a água caindo e só isso acontecendo. comecei a respirar. fazendo barulho, bem alto. cada momento de respiração, eu me fazia mais leve. e soltava o ar, barulhando. enquanto soltava, eu não me desfazia do meu peso, da agonia que persistia. enquanto inspirava eu tomava consciência da dor que eu guardava. e respirava, levava um alívio por momentos ----------------- inspirando, comecei a soprar. soprei fazendo mais barulho, parecia um assobio rouco. fazia o inspirar contando o momento, descrevendo com o som, sendo.

hoje nada aconteceu e eu percebi que preciso de coisas acontecendo dentro de mim. preciso de coisas acontecendo. preciso que aconteça algo que me tire da minha certeza de precisar de coisas. tenho fome. mas ainda não ruminei o que tive. passou-se tanto tempo que esqueci de digerir os atos.

hoje ainda é ontem, não cheguei a tempo de pensar num tempo de conjugação de fosse constante. pra sustentar minha significação, a precisão. então não sustento, que fique marcado que não sustento. que fica destoante e vacile.

não choro faz um tempo, também não compreendo, só tenho fome.

F