revoada

longe longe
ainda assim, domingo
sendo estado em toda parte
se instaurando
na condição de distante

pois, domingo foi devagar como se é
devagar no centro.
na rua só passavam pernas vagarosas
pares que foram ver o sol
ou o o simples passar das folhas na rua
caindo caindo

pois, domingo passando num ensolarado amplo
começaram a chegar aos poucos,
uma voz ou outra se achegando no silêncio do dia
na viela, comércio fechado,
cafés abertos

domingo foi perdendo o olhar vagaroso e a quietude
pois as crianças já se amontoavam muitas, querendo festa
uma a uma já se estavam em bando
os pais chegavam, deixavam, partiam

um relutou em estar, chorou.
queria ficar, gritar como os outros,
adentrar nas portas e janelas coloridas, nas fantasias nas caixas
ao mesmo tempo, seus olhos não ficavam,
se grudavam na porta
caçando a avó,
- passarinho voa mas tem que pousar.
a avó teve que permanecer, foi para o café do outro lado da rua.
explicou ao passarinho, os olhos continuaram inquietos,
mas voou.

mansinho mansinho se achegaram outros dois passarinhos
cada um de um lado do pai, firmes nas mãos unidas
o pai soltou o primeiro, alçou um voo amplo, alto.
foi.
o canto do passarinho já se juntou à canção do espaço
com todos os outros que já se espalhavam.

pois, ainda agarrada à mão do pai a menina esperava.
era bordada em saia rodada, em laço no cabelinho crespo, curtinho
redondinha,
era pequenina, era beija-flor.
a menina não parecia acuada pelo tamanho,
ela olhava e esperava.
o pai soltou. voou bonito, voou leve
cantou com os outros passarinhos,
rodopiou um pouco, balançou o vestido.

mas domingo tem dessas coisas,
qualquer rapidez cessa no repente.
a menina parou,
buscou o pai e não achou.
não chorou.
os passos foram correndo até a porta,
braços tentaram parar a menina, não pode correr pra fora!
mas braço nenhum pega beija-flor.
ela saiu, saiu e viu o pai, longe
gritou:

-papai, esqueceste dos meus beijinhos!